Tássio Amaral

Imagine você ser, servidor público ou empregado público de cargo de nível médio exercendo atribuições e responsabilidades de um cargo de nível superior sem receber devidamente alguma vantagem financeira, isso pode?

Isso é algo comum e representa o desvio de função e você pode ter direito de receber diferenças remuneratórias dessa situação.

O desvio de função de servidores públicos, acontece de forma frequente em toda a Administração Pública, tanto na esfera Federal quanto nas Estaduais ou Municipais, tanto no Poder Executivo como Legislativo ou Judiciário.

Como então identificar isso na prática?

Antes de apresentar a identificação preciso apresentar alguns pontos importantes que nos ajudam na compreensão das principais formas do desvio de função.

A Constituição Federal no artigo 39 instituiu o regime jurídico único dos servidores públicos e a necessidade de organização dos servidores públicos em carreiras de servidores.

O que são carreiras de servidores públicos?

As carreiras são agrupamentos de cargos públicos por imposição de lei que regulamenta os cargos públicos, a forma de remuneração, atribuições, requisitos para tomar posse, complexidade de atribuições, responsabilidades e formas de evolução funcional, desde que sejam observados princípios da legalidade e principalmente da igualdade.

A organização de cargos em carreiras se assemelha com a proposta da iniciativa privada de ter planos de cargos carreira e crescimento.

A Constituição Federal ao estabelecer que os cargos públicos se desenvolvem em carreiras tem como objeto o interesse que o servidor público possa ter crescimento e desenvolvimento para assim interesse em aperfeiçoar, possibilitando reajustes salarias previamente determinados em níveis de crescimento.

Assim, o cargo público é aquele em que o servidor público após passar em concurso público toma posse.

Então você precisa saber as atribuições e responsabilidades previstas na estrutura do seu cargo, bem como compreender quais atividades deve executar e suas particularidades e isso será identificado na lei de criação da sua carreira.

Atribuições, hierarquia e fixação da remuneração dos servidores públicos

O § 1º do artigo 39 da Constituição Federal estabelece que a remuneração dos servidores públicos atenderá:

I – a natureza, o grau de responsabilidade e a complexidade dos cargos componentes de cada carreira;

II – os requisitos para a investidura

III – as peculiaridades dos cargos.

Haverá assim um escalonamento dos cargos públicos ao longo dos anos em níveis hierárquicos para possibilitar crescimento e desenvolvimento dos servidores públicos.

Esse escalonamento poderá ser na forma horizontal, em que no mesmo nível poderá ter a alteração dentro da mesma classe, recebendo um aumento remuneratório, exemplo de escalonamento horizontal: 3ºclasse de auxiliar administrativo nível I, auxiliar de administrativo nível II, auxiliar administrativo nível III.

Já o escalonamento da forma vertical é aquele que eleva o nível de responsabilidade e atribuições, resultando assim em uma alteração no nome do cargo em algumas situações, seguindo o exemplo anterior, 2ºclasse de auxiliar administrativo nível I, auxiliar de administrativo nível II.

Para existir a evolução dever ter na carreira mecanismos de verificação de requisitos tais como escolaridade, tempo de serviço no cargo, existência de vagas, critérios de desempate bem como as vantagens existentes e uma comissão processante de avalição.

Geralmente as leis de carreiras de servidores tratam de responsabilidades específicas que vão aumentando a medida em que o servidor público começa a evoluir, por isso, é importante saber se você está exercendo atividades do seu nível hierárquico respectivo.

Tipos de desvio de função

Para o Superior Tribunal de Justiça, quando o servidor público está em desvio de função é devido recebimento da diferença da remuneração do cargo do qual exerce as atribuições, bastando somente a comprovação do desvio de função.

Assim, apresento três situações comuns e que apresentam diferentes situações comuns de desvio de função:

  • a) O servidor público, exemplo, da carreira de magistério, inicia no cargo de Professor de classe C, devido à ausência de professores, ou por necessidade de exercer a substituição de algum colega, começa a exercer as atribuições do Professor de classe B, assim é devida a diferença remuneratória ainda que ele seja da classe anterior no período em que exercer o desvio de função;
  • b) Auxiliares de serviços gerais exercendo atividades de oficial administrativo;
  • c) O servidor público do cargo de nível médio, porém, com diploma de nível superior em área específica é levado a exercer atividades de servidor do cargo de analista (nível superior), nessa situação também ocorre o desvio de função.

Como comprovar o desvio de função?

Para que o servidor público possa receber as diferenças remuneratórias do desvio de função é necessário demonstrar que:

  • a) Exerce atribuições diferentes do nível do seu cargo atual na mesma carreira que corresponderiam a outro padrão; ou
  • b) Exerce atribuições diferentes do seu cargo e em outra carreira; ou
  • c) Exerce atribuições diferentes do seu cargo mas em mesma carreira, porém em nível superior;

A demonstração do exercício de atribuições diferentes do seu cargo ocorre especialmente pela apresentação de provas que chamamos de materiais ou testemunhais.

As provas materiais são atos administrativos praticados pelo servidor público, documentos elaborados e assinados, relatórios, participação em reuniões com atas de registro, folhas de ponto, local de trabalho, bem como, se houver alguma portaria, decreto, despacho que designe o servidor a exercer as atribuições extraordinárias.

Nessa situação é importante juntar provas desde o início do exercício na função diversa para que possa receber os retroativos.

Já a prova testemunhal são colegas servidores do mesmo posto de trabalho, ou terceiros que têm conhecimento da função exercida.

Diante de provas assim poderá o servidor público pleitear na Justiça o recebimento das diferenças pelo desvio de função.