Imagem: Arte Migalhas

Lara de Coutinho Pinto

A melhoria das condições de trabalho e remuneração de uma das categorias profissionais que foi tão importante para o enfrentamento da covid-19 no país continuará em expectativa até que o Planalto encontre uma fonte de custeio para a medida.

Foi aprovado pelo Congresso Nacional e aguarda sanção presidencial o projeto de lei que cria o piso salarial de enfermeiros, técnicos e parteiras (PL 2564/20). Porém, a implementação dessa medida para servidores públicos depende da alteração de leis que disciplinam as carreiras nos três níveis federativos.

O Congresso tem competência para dispor sobre salário-mínimo das diversas categorias profissionais. Contudo, a existência de um piso salarial nacional não implica a alteração automática dos patamares de remuneração fixados por lei para as carreiras públicas. A alteração dos regimes nos níveis Federal, Estadual e Municipal depende da edição de nova lei específica que adeque os rendimentos atuais ao patamar mínimo.

Porém, diante de um patamar nacional para as categorias (como a enfermagem) os entes federativos não podem se omitir no dever de readequar as leis que regem suas carreiras para incorporar esse direito dos trabalhadores. Caso se concretize a mudança, cabe aos chefes do poder executivo dos três entes federativos encaminhar ao legislativo o projeto de adequação das carreiras, sob pena de omissão inconstitucional, por ofensa ao art. 7 e incisos da Constituição Federal.

É importante destacar que a adequação das carreiras deve ser compatibilizada com regras que regem o orçamento público. Os projetos de lei que versarem sobre o tema implicam um incremento de despesa obrigatória e de caráter continuado nos termos do art. 17 da LRF – lei de responsabilidade fiscal e, nessa condição, devem ter seu impacto previsto e compatibilizado com o ciclo das leis orçamentárias.

Impactos
Não por outro motivo a repercussão da aprovação do projeto de lei que aprova o piso para a enfermagem fora imediata. A CNM – confederação nacional de município estima que a instituição do piso da enfermagem terá um impacto anual no orçamento das administrações municipais do país em torno de R$ 9,4 bilhões, mas não há caixa disponível nas prefeituras para bancar esse piso. Nesse contexto o próximo desafio do projeto de lei é definir uma fonte de custeio para garantia da efetividade da medida.

O fato é que sem a garantia das fontes de financiamento para auxiliar sobretudo hospitais filantrópicos e municípios, onde o impacto do piso da enfermagem pode ser significativo, o projeto de lei pode ser vetado quando for para sanção presidencial por vício de inconstitucionalidade, afinal se trata de proposta legislativa que implica em aumento de gastos.

Como bem ressaltou o ministro Barroso na ADIn 7145, os projetos de lei para alteração de carreiras são de iniciativa exclusiva do Poder Executivo por implicarem aumento de despesa. Nesse ponto, não cabe ao Poder Legislativo, por iniciativa própria, majorar os gastos do Executivo sem demonstrar como o impacto adicional será compatibilizado com o orçamento. Isso porque a escassez do orçamento público impõe restrições fáticas ao grau de realização e ao alcance subjetivo de direitos que, no plano teórico-constitucional, exigem realização máxima e abrangência total.

A verdade é que a melhoria das condições de trabalho e remuneração de uma das categorias profissionais que foi tão importante para o enfrentamento da covid-19 no país continuará em expectativa até que o Planalto encontre uma fonte de custeio para a medida. Somente assim é que enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem e parteiras poderão comemorar o reconhecimento do Parlamento pelos seus esforços.

 

Lara de Coutinho PintoLara de Coutinho Pinto  Advogada