Dimas Ramalho

 

A violência contra as mulheres precisa ser combatida de todas as formas possíveis. Para fortalecer políticas públicas e complementar o amparo legal já existente, cabe aos agentes do Estado identificar injustiças ainda praticadas contra o gênero feminino e inovar para garantir direitos fundamentais.

Sintonizados com essa premissa, muitos municípios brasileiros promulgaram leis para impedir que agressores condenados pela Lei Maria da Penha sejam nomeados para cargos públicos. Essas legislações exprimem exigências éticas que demandam dos agentes públicos idoneidade moral e honradez para atuar em nome da Administração Pública.

Seria de todo incoerente e até mesmo ilegítimo que agressores, condenados em última instância por violência contra mulher, ostentassem prerrogativas inerentes aos cargos públicos. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal confirmou a constitucionalidade de lei municipal que vedava o provimento de cargos por condenados no âmbito da Lei Maria da Penha.

No RE 1.308.883, o Ministro Edson Fachin afastou a arguição de inconstitucionalidade por vício de iniciativa parlamentar e afirmou que diplomas com esse conteúdo normativo impõem regra geral de moralidade administrativa, concretizando os princípios do artigo 37 da Constituição cuja aplicação independe de lei e não se submete a uma interpretação restritiva.

Essa decisão assume um papel fundamental para reforçar a efetividade de uma lei cujo objetivo é a salvaguarda da dignidade feminina. Vale ressaltar que o Supremo não só avalizou o conteúdo material da legislação, mas, sob perspectiva formal, também garantiu ampla titularidade de iniciativa legislativa, de modo que tanto os vereadores como os Prefeitos podem apresentar projetos para impedir que agressores de mulheres ocupem cargos públicos.

Em outros termos, todos aqueles que ocupam cargos eletivos nos municípios podem agir para intensificar a eficácia social e jurídica da Lei Maria da Penha.

E que impacto isso tem na atuação do controle externo da Administração Pública? Minha percepção é que os Tribunais de Contas precisam se colocar como organismos indutores de boas políticas públicas, a partir de sua dimensão pedagógica e da atribuição constitucional que lhes defere a análise de aspectos que superam a mera legalidade formal. Podemos e devemos exigir dos gestores ações e resultados capazes de transformar o cenário social.

Nesse contexto, surge a necessidade de verificarmos, em auditorias e fiscalizações, em que medida os municípios, bem como o Estado, têm obstado o acesso de agressores aos cargos públicos, em observância ao princípio constitucional da moralidade.

Além disso, a aprovação de leis locais que vedam a nomeação de condenados no âmbito da Lei Maria da Penha pode servir de critério para compor, por exemplo, a nota dos índices da boa gestão pública, como é o caso do IEG-M do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo.

Portanto, as Cortes de Contas, no exercício de suas atribuições, podem estimular e compelir os agentes políticos locais a implementar medidas que prestigiem a defesa intransigente da integridade física e moral das mulheres.

 

Dimas Ramalho é Presidente do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo.