De quem são os Direitos Autorais das obras produzidas por Inteligência Artificial

Figurinha carimbada nas histórias de ficção científica, a Inteligência Artificial (IA) tem se tornado cada vez mais presente no cotidiano das pessoas ao redor do mundo. No entanto, assim como muitas das inovações vindas da Internet, leva um pouco de tempo para que a sociedade se adapte à sua chegada.

Uma das muitas áreas afetadas pela Inteligência Artificial é a da Propriedade Intelectual, que tem um grande desafio pela frente: definir a autoria de obras criadas por IA com pouca ou até mesmo nenhuma ação humana por trás.

Analisaremos essa questão com base em dois textos, o artigo “A questão da autoria em obras produzidas por Inteligência Artificial”, de Pedro de Perdigão Lana, doutorando em Direito; e o ebook “Inteligência Artificial e Criatividade – novos conceitos na propriedade intelectual”, de Marcos Wachowicz, professor de Direito e de Lukas Ruthes Gonçalves, doutorando, todos da UFPR.

O que é IA?

Primeiramente, o que é IA? Inteligência Artificial é o nome dado a algoritmos que conseguem realizar ações cognitivas parecidas com a dos seres humanos, como aprender coisas novas, reconhecer padrões e resolver problemas.

Parece ficção, mas as atuais assistentes virtuais – como Siri, Google Assistente, Alexa, entre outras – se utilizam desse sistema e são parte do cotidiano de milhões de usuários de smartphones ao redor do mundo. Além disso, diversas empresas e laboratórios nacionais e internacionais têm se utilizado da Inteligência Artificial para tornar suas atividades mais eficientes.

Como o objetivo da IA é fazer com que o computador “pense” como um ser humano, ao analisar os dados disponíveis na Internet, a Inteligência Artificial consegue “aprender” coisas novas através do machine learning e, a partir daí, modificar seu comportamento de forma autônoma. Dessa forma, a interferência humana sobre a máquina é quase mínima e isto possibilita, por exemplo, que um computador escreva poemas originais baseados em milhões de obras disponíveis ou pinte quadros do zero a partir de técnicas pré-existentes.

No entanto, não tem como uma tecnologia desse nível chegar na sociedade sem causar alguns impactos. No cenário jurídico, o atual debate não é sobre se a IA mudará alguma coisa, mas sim o quão profundas serão as mudanças que já estão acontecendo, principalmente no que diz respeito ao Direito do Autor.

Obra e originalidade

Para que uma obra seja considerada como tal, ela deve ser exposta para que outras pessoas a vejam; deve ser criativa, ou seja, ser original e ter uma função; e, por último, deve ser uma criação do intelecto. Esses também são os critérios necessários para que a obra receba proteção legal.

Voltando à Convenção de Berna, o artigo 2º define que as obras protegidas enquadram todas as produções científicas, literárias ou artísticas, em qualquer forma de apresentação. Isto significa que a maneira como as obras são produzidas ou expostas, assim como o conteúdo delas são indiferentes à Convenção.

Em caso de processos ou ações judiciais, por exemplo, o valor artístico, subjetivo e cultural de uma obra não deve ser considerado, assim como a qualidade do conteúdo e a finalidade do trabalho. Portanto, pensando na questão da Inteligência Artificial e o Direito Autoral, o foco de uma obra nunca é o mérito da arte, mas sim se ela cumpre todas as exigências da legislação.

A porquinha Pigcasso e sua tutora, Joanne. Foto: reprodução/ retirada do Instagram @pigcassohoghero

Alguns casos de obras feitas por autores não humanos causaram polêmica ao redor do mundo. Um exemplo interessante é o da porquinha sul-africana Pigcasso que, auxiliada pela tutora, Joanne Lefson, faz pinturas abstratas sobre telas. Pigcasso se tornou o primeiro animal a ter a própria galeria de arte e os valores arrecadados com as vendas das pinturas servem para financiar o refúgio onde ela vive.

Também o caso da “selfie do macaco” é um episódio curioso que aconteceu na Indonésia. O fotógrafo britânico David Slater entrou em uma disputa com a PETA (Pessoas pelo Tratamento Ético de Animais) pelos direitos autorais de uma série de fotografias que incluem a famosa “selfie do macaco”.

Numa reserva ambiental da Indonésia, Slater deixou sua câmera sozinha por alguns momentos e, ao retornar, encontrou algumas fotos de um macaco sorridente. O fotógrafo foi processado por comercializar a imagem retratada sem ser considerado o autor da foto, já que quem apertou o botão da máquina foi o macaco, mesmo Slater afirmando que deixou a câmera ligada intencionalmente próxima aos animais.

O caso repercutiu tanto que foi parar nos tribunais americanos. O fotógrafo e a organização acabaram entrando em um acordo, mas a justiça estadunidense estava inclinada a dar o ganho de causa a Slater.